domingo, 26 de abril de 2015

Comemorações do 25 de Abril em Mogadouro

Como vem sendo hábito, decorreram neste sábado as comemorações do 41.º aniversário do 25 de Abril. A efeméride esteve a cargo da Assembleia Municipal de Mogadouro e dividiu-se em duas partes. A primeira teve lugar na noite de 24, com um espectáculo musical em que as oficinas de música do Município de Mogadouro e o convidado Victor Lopes tocaram diversos temas do falecido Zeca Afonso. No dia 25, propriamente dito, houve uma marcha pela Liberdade ao longo das ruas da vila, hastear da bandeira nos Paços do Concelho e sessão solene com leitura de textos por parte da ACEITTA e as habituais intervenções dos oradores convidados.
 Aspecto do concerto do dia 24.
 Paços do concelho, com revista à guarda de honra do corpo activo dos bombeiros voluntários.
Mesa solene (Teresa Cordeiro, Francisco Guimarães, Ilídio Vaz e Antero Neto) e actores da ACEITTA.
Fotografias da autoria de Francisco Pinto.

Este ano, coube-me a honra de discursar em representação da Mesa da Assembleia, por delegação do Presidente da mesma, Ilídio Granjo Vaz. Eis o meu discurso:

"Ex.mo Senhor... (seguem-se os cumprimentos protocolares).

É com grande honra que hoje me dirijo a esta plateia, a convite do senhor Presidente da Mesa da Assembleia Municipal de Mogadouro, a quem desde já, agradeço a oportunidade.
Quando fui convidado, preocupei-me em rever os discursos que em anos anteriores tinha proferido neste palanque. E quando os li, verifiquei que se mantinham perfeitamente actuais. Nada mudou de então para cá. Infelizmente. Mas, depois reflecti no que ali tinha escrito, nomeadamente na descrição do estado horrífico a que chegou a nação e pensei: mas, se eu fui militante do Partido Socialista durante vinte anos e agora estou aqui em representação do Partido Social Democrata e foram precisamente estes dois partidos políticos os principais responsáveis pelo estado actual da situação do nosso país, que sentido faria estar aqui a descrevê-lo? Por isso, não será esse o rumo da minha intervenção.
Aproveito ainda esta oportunidade, e depois de ter escutado os belos textos aqui lidos pelos actores da ACEITTA, para deixar uma sugestão aos responsáveis máximos da Câmara Municipal e da Assembleia Municipal: que promovam um trabalho de recolha de depoimentos de quem vivenciou o 25 de Abril no concelho de Mogadouro e reúnam esses testemunhos em livro. Seria um documento de trabalho riquíssimo para utilizar em futuras edições comemorativas desta efeméride.

Feito este pequeno intróito, passo a ler-vos as breves palavras que escrevi para esta ocasião:

25 de Abril - A IMPORTÂNCIA DA MEMÓRIA

 Comemoramos hoje e aqui o 41.º aniversário da revolução de Abril que nos escancarou as portas da democracia, colocando fim a um período ditatorial que causticou o país durante mais de 40 anos. Contudo, peço-vos que não encareis esta comemoração como "mais uma". Mais uma cerimónia aborrecida, que temos que suportar por força da posição institucional que cada um de nós ocupa. Uma cerimónia onde vamos debitar, ou ouvir debitar, mais e mais banalidades acerca da palavra "liberdade".
Não! Esta comemoração é importante! E assume tanto mais relevo, porquanto atravessamos uma conjuntura de grave crise! E são precisamente as condições a que nos conduziu essa crise que nos impõem uma séria e aturada reflexão acerca da real importância e acutilância do verdadeiro significado de "Abril".
Daí, o título a que subordinei esta minha curta intervenção: a importância da memória! Não é segredo para ninguém que a crise não é exclusivamente do foro económico. É igualmente, e sobretudo, de valores! E o Povo não é surdo nem cego. Começa a agitar-se no seu âmago! Começa a questionar-se se terá valido a pena esta revolução de Abril! Aqui e ali, começamos a ouvir entoar sérias loas ao regime que Abril depôs!
Por essa razão, torna-se imperativo dar ouvidos ao Povo! Tomar-lhe o pulso! Porque , ao contrário do que sempre nos quiseram fazer crer, Portugal não é um país de brandos costumes! E se a memória de alguns é curta, permitam-me então que faça aqui uma incursão telegráfica, mas necessária, pelos fólios da História do séc. XX português. Podeis pensar que vou invocar eras longínquas. Desenganai-vos. Vou-vos falar de factos que este suposto país de brandos costumes viveu há menos de 100 anos! Permiti-me que vos recorde que durante a chamada Primeira República, que vigorou entre 1910 - data da implantação do regime republicano - e 1926 - data da implantação da ditadura, estima-se que morreram milhares de portugueses em consequência dos conflitos civis! E houve governantes que foram chacinados no meio de purgas políticas sanguinárias, como aquela que ocorreu em 19 de Outubro de 1921 e que ficou conhecida para a posteridade como a "noite sangrenta", em que foram barbaramente assassinados António Granjo - transmontano e ex-chefe de governo - conjuntamente com Carlos da Maia, Freitas da Silva e Machado Santos, herói da revolução de 1910! E antes disso, em 1918, foi igualmente assassinado Sidónio Pais, que era então o Presidente da República. E, repito, isso não foi assim há tanto tempo (há gente viva que nasceu antes dessas datas)!
Desenganem-se, pois, aqueles que julgam que o povo é e será eternamente sereno e ordeiro. As aparências iludem! A paz podre que vigora artificialmente, alimentada pela corrupção que grassa no seio da classe dirigente e que nos dias que correm se materializa, por exemplo, na prisão preventiva de um ex-primeiro-ministro, na prisão preventiva de diversos altos quadros da função pública, bem como na suspeição que é permanentemente lançada sobre a conduta ética e cívica de quem nos governa, pode conduzir a resultados extremamente perniciosos e incontroláveis para o nosso sistema democrático!
Daí a importância desta comemoração. Do reavivar do sofrimento colectivo que representou a ditadura! Que Abril nunca morra nos nossos corações, e que mantenhamos os sentidos alerta para o perigo que, qual espada de Dâmocles, permanece em suspenso sobre o frágil pescoço do sistema democrático português! Hoje, mais do que nunca, urge rememorar e comemorar "Abril"!
Viva Portugal!
Viva Mogadouro!
Viva o 25 de Abril!"