terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Chocalheiro de Vale de Porco

Como era a única figura solsticial que me faltava observar in loco, este ano resolvi passar a manhã natalícia em Vale de Porco para poder apreciar o "chocalheiro". Esta aldeia, tal como muitas outras, é vítima da crescente desertificação. Quase não se vê vivalma. Questionei uns homens que andavam de redor do mata-porco e informaram-me que já por ali tinha passado. Dei a volta à aldeia e... nada! Já tinha decidido regressar a Mogadouro, quando me deparei com uma dupla de chocalheiros.
Aqui, executam a dança ritual de sacudir os chocalhos, enquanto saltam e emitem sons guturais.
A indumentária é tal e qual como a que Santos Júnior descreveu na caracterização que nos legou do carêto de Valverde. Encontram-se lá todos os elementos integradores do espírito solsticial: a serpente, os cornos, a cor vermelha e os chocalhos (que, como já aqui foi dito, possuem carácter apotropaico, isto é, servem para afastar os maus espíritos da comunidade).
À despedida, tive oportunidade de trocar dois dedos de conversa com o amigo Valdemar, que me transmitiu um pouco da história e me contou que quando a aldeia era pujante, o chocalheiro perseguia os mais novos e obrigava-os a refugiarem-se em casa. A rapaziada persistia e voltava a cirandar atrás dele. A localidade enchia-se de barulho e alegria. Conta-me minha mãe que minha avó materna, que era natural de Vale de Porco, apanhou medo ao chocalheiro em criança e, mesmo de adulta, já em Bruçó, recusava-se a encarar de frente com os "Velhos", mandando meu avô a dar-lhes a esmola.
Aqui, o "Chocalheiro" também dá a volta ao povo, a pedir esmola para o Menino.
A tradição corre risco de desaparecer. Tem-lhe valido a perseverança de Dulcíneo Rodrigues, o alcaide local, que tem batalhado pela sua manutenção e divulgação. No futuro, e com a agregação da freguesia de Vale de Porco à de Mogadouro, vamos ver o que sucederá a esta festividade milenar...
À entrada do termo, o autarca mandou erigir um pequeno monumento à figura solsticial, mas,
como se pode observar, o fanatismo religioso e a proverbial estupidez humana não dão para mais...
Fotos: Antero Neto.