sábado, 12 de outubro de 2013

Gravuras rupestres em Travanca

Depois de uma manhã ocupada na vindima de gente amiga, em terras de Miranda do Douro, aproveitei a tarde soalheira para dar um pulo até Travanca. Esta aldeia já estava há muito por mim referenciada como eventual pólo de interesse sob o aspecto arqueológico. Na anterior visita fotográfica (ver aqui), fixei-me apenas nas pedras existentes no centro da localidade. Agora, o alvo foi o chamado "castelo". Travanca alberga sinais de muita antiguidade. Outrora pertenceu ao extinto concelho de Algoso e agora é cabeça de freguesia, integrante do concelho de Mogadouro. Do chamado "castelo" já nada resta para além da toponímia. Perguntando aqui e ali, cheguei lá sem grande esforço. E, deparando-me com um simpático e hospitaleiro casal de idosos, parei o carro e indaguei se era ali que ficava o meu objectivo.
- "É sim, meu senhor! É aqui mesmo. E eu sou o dono."
- "E como é que o senhor se chama?"
A resposta, pronta, veio em forma de verso:
- "Se alguém quiser saber o meu nome,
sou um poço muito fundo.
Sou José Carlos Aleixo,
em toda a parte do mundo!"
Estava dado o mote para uma tarde fantástica. Do alto dos seus 83 anos, ti Zé Carlos fez questão de me servir de cicerone dando-me a conhecer, com indisfarçável orgulho, toda a riqueza da aldeia.

Inserido no perímetro do que terá sido um castro, lá está o painel com as gravuras do género "unhadas do diabo" e várias covinhas (petróglifos semelhantes aos encontrados em Vila dos Sinos e em Tó - ver aqui). Conjunto muito interessante que atesta a antiguidade da ocupação humana do local.
 Pequena sequência de degraus escavados na rocha, no interior do castelo.
Local mais alto do castelo, de onde, segundo relatou ti Zé Carlos, existia o costume bárbaro de atirar os burrecos recém-nascidos para os matar, quando as famílias não tinham possibilidades de os sustentar ("Sabe, naquela altura havia muitos e as pessoas eram pobres. Não era como agora...").
Fragmento de pia encontrado no interior do castelo.
Cadeira em que ti Zé Carlos exercia o mester de barbeiro, aprendido em Sendim.
Restos mortais da capela de Santa Olaia. Não dá para ver muito. Apenas se constata que o templo tinha dois corpos distintos, pois é mais larga do meio para a frente. Não vislumbrei vestígios de arcos, mas a vegetação é tão densa que não permite tirar grandes ilações. A sua localização leva-me a crer que terá sido edificada sobre um sítio de culto ancestral...
A curiosa e imponente "Fraga de Pedro Galego". Consta-se que no seu topo existem insculturas rupestres, nomeadamente em forma de ferradura. Um popular garantiu-me que tinham sido feitas há poucos anos. Não consegui ver nada, pois a subida exige elasticidade que já não se coaduna com a minha massa corporal. Verifiquei, isso sim, que na base existem alguns abrigos intrigantes. Localiza-se sobranceira a um cotovelo da ribeira, pelo que, esse factor  a somar ao estranho nome (que ninguém me soube explicar), e à proximidade da capela de Sta. Olaia, leva-me a concluir que terá sido local de culto antiquíssimo. Mas, isso é mera especulação minha.

Numa das encostas que suportam o monte, próximo da ribeira, existe um curioso conjunto de "bodegas" escavadas na rocha, que serviam para armazenar o vinho. Infelizmente, já só se consegue ver uma (por sinal, a mais pequena). Parece que foram abandonadas porque eram alvo de frequentes assaltos à pinga...
Na zona da "Teneria", existe um moinho (havia vários ao longo da ribeira) que é precedido de um interessante carreiro escavado na rocha granítica (com alguns degraus). Foi possível observar algumas pequenas poças que, segundo ti Zé Carlos, serviam para alimentar os machos com grão. O entorno do moinho é belíssimo. Pena que, à semelhança de tantos outros, se encontre em ruínas.
Para finalizar a visita, mostrou-me a fonte que abastecia a aldeia, antes da água canalizada ali ter chegado. Bonito conjunto que servia pessoas e animais.
Fotos: Antero Neto.