quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Centro Monárquico de Mogadouro - Manifesto

Proveniente do arquivo familiar da família Morais Pimentel da Fonseca Ribeiro, descobri este panfleto, sem data, impresso na Tipografia Rêgo, em Mirandela. O manifesto, cujo teor se reproduz, visou os pretensos fundadores de um Centro Monárquico no nosso concelho, tendo como principal instigador um tal Dr. Cordeiro, da Saldonha, concelho de Alfândega da Fé, causticando-os fortemente e defendendo com unhas e dentes o regime republicano.


" Sob o principal impulso, acção e patrocínio do ex-conspirador da Saldonha, figura doublé de senhor feudal e negociante, homem que pouca gente conhece neste concelho e que ao mesmo não se encontra ligado, nem sequer pelo mais ténue laço moral ou afectivo, foram lançados no dia 7 do corrente, os lineamentos de um Centro Monárquico do Concelho.
E´seu representante, nesta vila, o Dr. Casimiro Machado,cuja dedicação à causa dinástica, contrasta, flagrantemente, com o que seria licito esperar da sua educação e mocidade.

Informam-nos que compareceram à reunião, e do centro nascente ficaram fazendo parte,ostensiva e claramente, porque os ocultos, por enquanto, são desconhecidos, os padres : António Pinto, de Castro Vicente; António Coelho, de Penas-Roias; Manuel Afonso, de S. Martinho; Mont´Alverne, da Castanheira; António Silvestre, de Valverde; e António Domingues, de Urroz. E os leigos : António Neves e Francisco Esteves, de Castelo Branco; António Felgueiras e João Lagoa, de Brunhoso; Joaquim Lagôa, de Soutelo; Abilio Felgueiras, de Vale da Madre; e sr. Basilio, maridado com a Chefe da Estação Telegrafo Postal desta vila, e, poucos mais, cujos apagados nomes nem vale a pena referir. Esses aí ficam para averiguações de futuras e bem possíveis responsabilidades !...

Não nos comove, nem tampouco embaraça, nos nossos sentimentos e acção de republicanos, os trabalhos de organização monárquica encetados, a não ser pelo que eles representam de provocador e porque os elementos, embora poucos, que neste concelho pretendam dar-lhe apoio, revelam um claro sintoma de insensatez e desejo de degladiação e retrocesso, num meio politico em que todas as actividades se deviam congregar, inteligentemente, para a consecução de um fim imediato : o engrandecimento, pela unificação de esforços, deste pobre e desprotegido concelho, onde não ha nada feito, e onde nada se poderá fazer, enquanto os seus homens se dividirem, degladiarem e odiarem.

Não o querem assim alguns mogadourenses, indo arregimentar-se nas hostes monárquicas, sob o comando de um olhar duro e egoísta, que os ha-de conduzir ... ao insucesso.

O caminho, decerto, não poderá ser outro !

Compreendemos nós que no campo bem rasgado dos princípios da liberdade e democracia, que devem florescer, como mimosa crença, no peito de todos os homens, sejam quem for, diferentes bandeiras partidárias se desfraldem, na sincera afirmação de um programa, cujos pontos de vista politico-doutrinários tendam à realização de uma aspiração comum : fazer grande a Pátria Portuguesa. Porém,que nesta altura do século XX, quando um sol de liberdade queima, ardentemente, todos os povos e lhes traça nos horizontes uma linha de ascendente e clara direcção; que nesta altura de conquistas liberais e democráticas, em que os povos saídos da mais tremenda guerra que a Historia regista, se afirmaram e decidiram, com a clareza insofismável dos factos históricos, contra o velho principio dinástico, que as aspirações e a ânsia de liberdade já não comportam, neste momento, fazendo tombar, ruidosamente, os tronos da Rússia, Áustria-Hungria, e Alemanha, fazendo erguer, brilhantemente, as republicas que substituíram as testas coroadas daqueles grandes países e implantaram, nas pequenas nacionalidades nascidas por desagregação, novas e vitalssimas republicas, como expressões populares dos governos que melhor se adaptam à feição do povo, à ordem natural da vida, ao conceito filosófico moderno a que se prende o fenomeno politico; que nesta hora de palpitante anseio, em que todo o mundo clama e proclama liberdade, e por ela luta incessantemente; que, precisamente, neste momento, em que á velha monarquia espanhola estão sendo dirigidos os mais formidáveis ataques, demonstrando-se, com viva documentação, que aquele Rei, ha pouco apontado como exemplo de dinastias, tem, ele e os seus aulicos, arrastado,contra a vontade da Nação - esmagada e sufocada por uma politica ferazmente egoísta, nascida na pessoa do Rei e transmitida por pessoas sem escrupulos - a velha Espanha à mais desgraçada e aviltante derrocada ; que, neste momento, repetimos, em que tudo isto somado dá a palavra - Liberdade - se venha pugnar pela fundação de um Centro monarquico, num concelho de tão fraca população eleitoral e em que as forças já por si são pequenas e quanto mais subdivididas mais se enfraquecem, mais se neutralizam, não compreendemos o que de elevado, o que de grande, o que de patriótico haja em tão desastrada tentativa !

Não compreendemos !

E incoerentes reputamos, e aqui declaramos, todos aqueles que dizendo-se católicos, a semelhante organismo dão o seu apoio, supondo nós que pouco honra a sua inteligência e, sobretudo o seu espirito de obediência às determinações ultimas da Igreja, que lhes ordena acatamento, respeito e colaboração com os poderes constituídos - A Republica ! Está provado que certos padres, poucos padres, são inimigos do regimen ! Quizemos, por uma politica de tolerância, de franca e por vezes abdicante tolerância, demonstrar-lhes que nós não tinhamos reservas, nem desejos de luta : o padre era católico, somente católico, e como tal pugnava pelas suas regalias, pelas regalias justas da Igreja ? Muito bem ! O padre servia-nos como um grande elemento de organização e educação moral, que convinha defender e amparar. E nesta corrente se ia lutando e trabalhando. Quasi todos os padres inteligentes assim procedem e se estão orientando nesse sentido. No nosso concelho ha, porém, alguns que enquistaram em uma ideia : são monarquicos. Pois bem : contra monarquicos ... republicanos. Não podemos contar com essas criaturas para nada, a não ser para nos guerrearem. Antes assim do que encobertos. Podem contar comnosco para tudo. Aceitamos o cartel de desafio .

Ficam assim delimitados e extremados os campos : os monarquicos são nossos inimigos, e, como tal, só podem esperar, da nossa parte, guerra leal, é certo, porque outra não sabemos nem podemos fazer, mas guerra impiedosa e sem tréguas !

E´honrada, é nobre esta franca declaração ! E assim fica assente : o concelho tem de escolher : ou nós republicanos, prontos sempre a trabalhar em favor de todos, ou o monarquico, o ex-conspirador e conspirador Dr. Cordeiro, procurando apenas a satisfação do seu egoísmo : uma candidatura apoiada pelo concelho de Mogadouro, visto que o concelho de Alfandega da Fé o corre e guerreia.

Há-de ser engraçado o deputado Dr. Cordeiro, a pugnar em Lisboa, perante republicanos, pelos interesses deste concelho ! Há-de ser um rio de benesses canalizado para este concelho, feito brotar da pedra da Republica, pela vara magica daquele ilustre representante !...

Os republicanos signatários, e os que não assinam, porque felizmente em Mogadouro e concelho, ainda há republicanos prontos, dispostos a tudo, consideram como um desafio o que se está fazendo aqui.

O concelho tem tempo de refletir.

Mesmo muito dos que se encontram envolvidos, talvez por irreflexão ou falsas informações - a tudo recorrem certos meneurs - podem ainda arrepiar caminho.

A Monarquia em Portugal é um impossível. Não há monárquicos de verdade, e não são os do estofo do Dr. Cordeiro que a hão-de restaurar, - que se hão-de bater com a falange republicana pela restauração monárquica.

Monsanto é a pagina mais clara e mais insofismável de que a monarquia não pode ser restaurada em Portugal.

Não sabemos para onde caminhará o país! Confiamos serenamente que a Republica nos salvará. Se, porém, ela caísse, não seria a monarquia chamada a substitui-la. A monarquia seria a guerra civil, feroz, odienta, terrível, em Portugal. Ela traria a perda não só da Republica, mas da própria nacionalidade. Claramente aí ficam essas palavras. Que as leia e medite quem estiver a tempo de refletir.

O Dr. Cordeiro, o Dr. Casimiro e outros, prestam um péssimo serviço ao concelho de Mogadouro. Está averiguado, com documentos apreendidos, que se trama uma vasta conspiração contra a Republica por todo o país. Este movimento, aqui, é o desenvolver da acção conspiratória. Quem conspira contra o regimen coloca-se na contingência de ir parar aonde o meterem ...

E´para onde vemos inclinar-se o movimento monárquico.

Ficaríamos de mal com as nossas consciências se não disséssemos claramente ao concelho de Mogadouro o que pensamos sobre o que se prepara e não lhe déssemos a entender qual a nossa atitude.

Ficam assim esclarecidas duas situações distintas: quem for republicano é contra monárquicos.

VIVA PORTUGAL ! VIVA A REPUBLICA !

Alípio Augusto Trancoso - Sub-delegado de Saúde
Henrique Cabral - Advogado e notário
Francisco António Vicente - Medico
Altino Norberto Morais Pimentel - Oficial do Reg. Civil
António Pereira Taveira - Conservador do Reg. Predial
António Baptista Rosinha - Inspector Escolar interino
Agostinho Braz - Alferes da G. Fiscal
Ernesto de Almeida Ferreira - Escrivão de Direito
António Maria Fernandes - Secretario de finanças
José Cludumiro Guimarães - Comerciante
Celestino António Pimentel de Carvalho - Tes. da Fazenda Publica
Carlos Alberto Pires - Comerciante
Horácio Costa - Comerciante
José Sanches Branco - Ajudante de notário
Diogo de Almeida - Comerciante
Ramiro Lopes - Comerciante
Guilherme Maria Pêra - Proprietário
Ernesto Augusto Garcia - 2º sargento reformado
José Joaquim Rodrigues - Chefe Fiscal
José Manuel Domingues - Amanuense da Câmara
Adriano José Machado - Amanuense da administração
Alberto Maria da Costa - Ajud. da Rep. do Reg. Civil
António Bernardino de Albuquerque - Aspir. Finanças
Diogo Albino Vaz - Aspirante de Finanças
Alexandre Joaquim Neto - Chefe Fiscal
Abílio Salgado - Secretario da Câmara
Joaquim Leite Velho - Proprietário
Manuel Américo Alves - Agenciario
Eduardo Augusto Mora - 2º sarg. da G. Fiscal
João Varão - 1º sarg. da G. Fiscal
António Augusto Soeiro - 2º Sarg. da G. Fiscal
José Afonso - 2º sarg. de engenharia
Manuel Maria Roxo - Oficial de diligências da Câmara
Fernando Augusto Paulo - Professor oficial
António Maria Trigo - Escrivão de direito
António Augusto da Silva Calejo - Comerciante
Antero Carlos Pinto - 1º sargento reformado
Francisco Ant. Lopes Moreira - Sec.º da Administração com declaração."

Deixo aqui um bem-haja aos elementos da família em questão pela divulgação deste e de outros documentos, cujo interesse é manifesto para a edificação da História local. Muito obrigado!