segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Castelo de Mogadouro


Foto: Antero Neto.
O viajante que chega a Mogadouro, seja qual for a via de acesso, depara-se obrigatóriamente com a silhueta majestosa e proeminente, orgulhosamente recortada no horizonte, da torre de menagem do castelo local.
Verdadeiro ex libris da terra, espécie de ícone fálico, associado a lendas de "moiras encantadas", é procurado por artistas das mais diversas áreas plásticas (pintura, desenho, fotografia...), que anseiam captar as suas mais poéticas facetas, ou então, simplesmente tirar partido do seu potencial enquanto objecto do "marketing" local (não há café, restaurante ou loja que se preze onde não conste uma qualquer panorâmica da referida ruína). Abandonado aos caprichos do tempo e à falta de dinheiro do IPPAR, pouco há já para ver daquele que, em tempos idos, foi um belo conjunto arquitectónico, e que, teimosamente, parece querer resistir, demonstrando verdadeiro carácter transmontano, fazendo jus àqueles que o rodeiam.
E, por mais que se vasculhe nas bibliotecas locais, raras são as referências dignas de credibilidade científica (histórica) feitas ao referido monumento. Tão pouco os autores, de uma maneira geral, perdem muito tempo a debruçar-se sobre as suas origens e evolução enquanto conjunto militar e/ou habitacional.
Sabemos que constituiu ao longo da sua história, conjuntamente com outras fortalezas vizinhas (Penas Róias, Algoso, Miranda do Douro) importante bastião, integrado na primeira linha de defesa contra as investidas dos castelhanos. Isto, apesar de ter estado ao lado do partido de Castela, contra D. João I, Mestre de Avis, na crise de 1383/85.
Acerca das suas origens e morfologia pouco se sabe e muito se especula. Sem nos querermos substituir nestas páginas a quem de direito (historiadores e arqueólogos), quisemos apenas realizar uma pequena pesquisa sobre a história do castelo de Mogadouro. Assim, encontrámos na obra de Duarte De Armas: "Livro das Fortalezas" (Arquivo Nacional da Torre do Tombo e Edições Inapa, prefaciado por Manuel da Silva Castelo Branco) as gravuras mais completas sobre o conjunto arquitectónico. Duarte De Armas (também chamado Duarte Darmas, ou Duarte D'Armas), escudeiro da Casa de D. Manuel I, hábil desenhador, foi encarregue por este de vistoriar as fortalezas que constituíam a primeira linha de defesa face ao belicoso vizinho castelhano, bem como de se inteirar acerca do seu estado de conservação. Foi assim que, montado a cavalo e acompanhado por um servo a pé, percorreu e desenhou todas as fortalezas fronteiriças do país bem como as respectivas plantas. Graças a ele podemos ver como era o castelo de Mogadouro ao tempo do alcaide Álvaro Pires de Távora (1495 - 1531), cerca do ano de 1509.
Por sua vez, pode ler-se no "Guia de Portugal" (3.ª Ed., 5.º vol., editado pela Fundação Calouste Gulbenkian), p. 1021, "... o castelo, concedido em 1297, pelo rei D. Dinis à ordem dos templários, foi transferido alguns anos mais tarde (em 1319) para a Ordem de Cristo, sucessora daquela." E, num comentário a um dos desenhos de Duarte De Armas, descreve: "Vista do lado do Poente, desenhava-se, num dos ângulos, o mais soalheiro, a espaçosa alcáçova dos freires comendatários. No alçado frontal, nitidamente apalaçado, recortam-se onze aberturas, distribuídas em dois pisos, destacando-se em cada um, um belo balcão assente em três salientes cachorros. Sobre os telhados íngremes, elevam-se duas chaminés tubulares, coroadas de graciosas cabeças. À esquerda, ou seja, no ângulo virado a Noroeste, avulta o conjunto acastelado, propriamente dito, constituído pela torre de menagem, uma cinta murada, um cubo saliente (que talvez seja o que ainda hoje existe) e um cubelo cilíndrico."
Neste Guia é-nos igualmente relatado um curioso episódio histórico: "... as rixas entre a gente mogadourense e os moradores leoneses da povoação fronteiriça de Formoselhe eram frequentes e violentos, com injuriosos apupos de lado a lado, sobre o Douro e uma vez por outra assaltos e refregas", salientando à frente que o prior de Mogadouro e o conc. Leonês para fazer face a tamanha desordem estabeleceram que "... qualquer injúria, agressão ou malfeitoria seriam consideradas aleivosas e, como tal, sujeitas a penas capitais a quem as provocasse ou executasse." (idem, p. 1017).
Voltando ao castelo, Armando de Lucena, na obra "Castelos de Portugal - histórias e lendas" (onde cita o "Portugal Económico, Artístico e Monumental" de Casimiro Machado), escreve que "... a grande antiguidade desta construção torna confusa e muito incerta a data da fundação do castelo", atribuindo as suas origens à época romana.
Ainda a propósito das origens do castelo mogadourense, escreve o espanhol Julio Llamazares ("Trás-Os-Montes - uma viagem portuguesa", Ed. Difel) que o castelo de Mogadouro também foi dos Templários, e antes desses dos Árabes e Godos. Defendendo mesmo que terá sido dos maiores de toda a região quando os Árabes ainda o ocupavam. Afirma igualmente que terá sido o Marquês de Pombal que o mandou derrubar (não nos esqueçamos que estamos em terras de Távoras); contudo, não apresenta qualquer fonte credível, num livro assaz pretensioso e de um pedantismo a toda a prova (de Espanha nem bom vento, ...).
Para terminar, fica aqui um voto de esperança mogadourense para que, num dia não muito longínquo, o IPPAR resolva deixar fazer quem quer e quem pode, de modo a salvar o pouco que ainda vai restando da nossa memória histórica colectiva.
Antero Neto