sábado, 27 de junho de 2015

Ponte de Remondes - subsídios para a sua história

Agora que o caudal do Sabor se prepara para a engolir, fica aqui um tentame para aclaramento da história desta notável estrutura, cuja origem remonta ao séc. XVII, mas que foi sofrendo sucessivas obras de reabilitação e remodelação até há bem pouco tempo (a última intervenção terá sido há cerca de dez anos atrás).
Tudo começou em 1591. Segundo o alvará régio que Sousa Viterbo reproduz nas pág.s 452 e 453 do primeiro volume do seu "Diccionario historico e documental dos architectos...", a obra foi posta a concurso, inicialmente, naquele ano. Contudo, e ainda segundo o teor do mesmo alvará, datado de 12 de Setembro de 1611, a pedido dos oficiais da Câmara de Mogadouro, a obra foi novamente lançada a concurso nesse ano, porque os arrematantes da primeira empreitada faleceram sem a construir. Porém, a obra parecia estar amaldiçoada, pois ninguém a quis construir pelo preço proposto. O novo arrematante, João Gonçalves, de Torre de Moncorvo, sugeriu alterações ao projecto, mas pediu mais três mil cruzados do que o inicialmente previsto. Foi lançado imposto (finta) para pagamento dos três mil cruzados pelas comarcas de Guarda, Coimbra, Esgueira e Viseu, e pelos restantes nove mil cruzados (preço inicial), foram taxadas as comarcas de Miranda, Torre de Moncorvo, Guimarães, Porto e Lamego.
A ponte haveria de ficar concluída em 1678, conforme consta de uma epígrafe que se encontrava no local e que alguém se deu ao trabalho de furtar (certamente, para a guisar com batatas...). A epígrafe assinala que a obra foi realizada por mestre António de Sousa, de Torre de Moncorvo, sendo provedor o Doutor Diogo Vaz de Aguiar. Como se pode ver, houve alteração no mestre da obra. Como, quando e porquê, não sei.
A montante desta ponte, existem restos de uma outra muito mais antiga, aparelhada em xisto (note-se que não pode haver confusão com a mencionada no alvará, pois ali prescreve-se especificamente que o aparelho será feito em granito!).
Em 1758, o padre Luís Barbosa, cura de Castro Vicente, na resposta ao inquérito que ficou conhecido como "Memórias Paroquiais de 1758", escreveu que "A segunda [ponte] hé no termo desta villa entre esta villa e Remondes, com sinco arcos de cantaria com baluartes da mesma cantaria. Também se acha sem goardas por lhes ter levado o rio no mesmo anno de mil setecentos e sete." ("As Freguesias do Distrito de Bragança...", JV Capela et alia, pág. 542).

Avançando uns anos, o Dr. António Mourinho, num trabalho publicado na revista "Brigantia", de Jan/Abril de 1996 (Vol. XVI, pp. 3-13), dá-nos conta de nova finta relacionada com a ponte de Remondes, lançada em 1796, após petições feitas nesse sentido, pelos competentes titulares camarários, em 1791 e 1792. Desta feita, o dinheiro destinava-se à realização de obras de reconstrução, após graves danos causados na estrutura pelas cheias ribeirinhas de meados desse século. O montante das obras orçou em três contos e duzentos mil réis e foi repartido pelas comarcas de Miranda do Douro, Torre de Moncorvo, Guimarães e Bragança. O mestre pedreiro responsável pela empreitada foi José Gonçalves, de Santa Maria de Âncora, no Minho.

Um outro apontamento histórico prende-se com o período das convulsões liberais. O juiz de fora de Monforte, Francisco Joaquim Teixeira de Macedo, lavrou um ofício, em Mogadouro, com data de 4 de Março de 1827, onde, entre outras coisas, diz que o regimento de caçadores 7, o batalhão de infantaria 6 e perto de cinquenta cavaleiros, que tinham pernoitado na aldeia de Remondes, tinham utilizado esta ponte na sua fuga ao exército constitucional, provindos de Mirandela, em direcção a Bruçó, para tentarem refugiar-se em Espanha. O general Telles, que os comandava, no ímpeto da fuga, danificou a ponte de Remondes, procurando assim atrasar o avanço dos seus perseguidores.

Terá sido devido aos danos provocados pela tropa nesta ponte que, em 30 de Julho de 1839, a Junta Geral do Districto de Bragança deixava lavrado em acta o seguinte texto:
"Entre as comunicações interiores do Districto merece a particular attenção da Junta, a Ponte de Remondes, collocada entre a villa de Castro Vicente, e Mogadouro, e communica os povos da margem direita com os da esquerda do Sabor, conduzindo por terra todo o commercio do Porto, e levando para o Districto de Villa Real todos os cereaes do Concelho do Mogadouro, e partido de Miranda: e é ainda mais interessante por ser o vehiculo do commercio para Hespanha pelo ponto de Lagoaça(...)
(...) e seria pena que uma obra tão magistosa, e que tanto dinheiro custou, e que tão precisa é, se acabasse de arruinar, por quanto já os seus arcos se acham descarnados, e as guardas cahidas
... "

Mais haverá certamente para contar acerca deste belo monumento. Ficará para investigação mais aturada.